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Uma criança ou adolescente é estuprado a cada oito horas em Mato Grosso

Uma criança ou adolescente é estuprado a cada oito horas em Mato Grosso

22/03/2021

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Um avô de 48 anos colocou a cabeça entre as pernas da neta, de 7 anos, enquanto a mãe da criança estava no trabalho, em Rondonópolis. Por semanas, uma criança que vive em São Felix do Araguaia foi vítima de estupro pelo próprio pai, de 40 anos. Casos como esses, que parecem incomuns, são cada vez mais frequentes nos boletins de ocorrência registrados por famílias mato-grossenses.

Para se ter uma ideia, em 2020, uma criança ou adolescente foi estuprada a cada 8 horas em Mato Grosso, considerando apenas registros que chegam à polícia. Isso porque, a subnotificação ainda é uma realidade nesse tipo de crime e coloca o estupro de vulnerável em terceiro lugar entre os crimes de violência contra menores. No ano passado, os casos notificados somaram 1,1 mil. O número é 21% menor do que em 2019, quando os registros chegaram a 1,14 mil, segundo informações da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp).

Conforme o Código Penal Brasileiro, estupro se configura por qualquer ato libidinoso não consensual, não apenas a conjunção carnal.

Os suspeitos dos crimes citados acima foram presos pela Polícia Civil ou Militar, nas últimas semanas, após serem denunciados pelas crianças, esposas e familiares.

Arquivo Pessoal

Psic�loga Olga Santana

Psicóloga Olga Santana: ideia de dominação

A psicóloga Olga Santana, que atua há 10 anos no Sistema Penitenciário de Mato grosso e agora estuda o comportamento de homens que cumprem pena pela pratica de crimes sexuais contra crianças, chama a atenção para o fato dos autores da violência sexual não serem pessoas estranhas às vítimas e que muitos casos podem demorar anos até que venham à tona.

Ao RDNews, ela conta que são muitos fatores que podem levar um adulto a abusar sexualmente de uma criança, sejam eles de ordem psicológica, psiquiátrica, social e cultural.

"Há fortes questões relacionadas ainda a uma cultura de dominação machista-patriarcal", pontua. Assim como as mulheres vítimas de violência doméstica e sexual, as crianças também são vistas pelos agressores como objetos para sua satisfação pessoal.

"Existem relatos de pesquisadores que encontraram nas falas de autores de violência sexual que dizem 'eu sou o pai dela, então o primeiro homem que ela vai ter sou eu'. A gente ainda escuta isso nos dias de hoje. Não é com tanta frequência, mas tem um contexto histórico e social de uma cultura machista por trás dos crimes de violência sexual”.

“Assim como as mulheres vítimas de violência doméstica e sexual, as crianças também são vistas pelos agressores como objetos para sua satisfação pessoal”

Psicóloga Olga Santana

Em outros, há aspectos da sexualidade do indivíduo que, não trabalhada, geram comportamentos disfuncionais. "Não é raro, segundo pesquisadores, que autores de violência sexual infantil tenham dificuldade de estabelecer relacionamentos sociais. Verifica-se um déficit da capacidade de interação social nesses autores de violência sexual. Sem ter olhar de empatia para aquela criança ou adolescente, eles estão preocupados em apenas satisfazer o seu próprio desejo sexual, desconsiderando o sofrimento do outro e a violência que está sendo perpetrada”.

 A pesquisadora Olga Santana aponta que a criança vítima de abuso sexual ainda não tem maturidade psíquica para compreender que o comportamento daquele agressor é algo inapropriado.

"A criança fica confusa com tudo que está acontecendo por que é alguém que ela ama, confia e, de repente, está fazendo algo que é uma violência física e psíquica. É uma experiência que ela não está preparada para vivenciar. Naquele momento, ela não está escolhendo viver o ato sexual, pois não possui maturidade para entender do que se trata, ou seja, ela não está dando o seu consentimento, está sendo violada em sua intimidade".

Como justificativa para seus atos, muitos abusadores dizem que as crianças vão esquecer dos abusos. "Quando é o contrário. Isso marca uma vida de uma criança. Marca o desenvolvimento e a forma como ela poderá se relacionam com os adultos de confiança. A confiança que talvez ela poderá deixar de ter nas figuras de cuidado e de proteção que ela tenha".

A psicóloga ressalta que, alguns agressores podem desenvolver crenças distorcidas de que o ato sexual com criança não se trata de uma violência, uma vez que só consideram que é violência quando a criança é machucada. “Percebe-se muito na fala de alguns que o toque e o carinho sexual não são lesivos. Então, alguns agressores não entendem e compreendem como abuso por que não agiram com violência física".

Nem todos são pedófilos

A psicóloga Olga logo ressalta que nem todo adulto que abusa sexualmente de uma criança é um pedófilo. "É senso comum que todo homem que abusa sexualmente de uma criança é um pedófilo, mas pedofilia é uma doença, com diagnostico próprio da psiquiatria. É complexo e requer muito cuidado em seu diagnóstico, mas existe essa diferença. Não podemos generalizar". Inclusive, a pedofilia está catalogado como um transtorno psiquiátrico de preferência sexual por crianças.

Para melhor explicação, a psicóloga pontua que o pedófilo é a pessoa com desejo sexual por crianças,são pessoas adultas (homens e mulheres) que têm preferência sexual por crianças – meninas ou meninos - do mesmo sexo ou de sexo diferente.

“A taxa de reincidência desse tipo de crime, mesmo quando tratados não cai drasticamente. Pesquisas não referendam a efetividade da castração química”

"Existem homens pedófilos  (e mulheres também em um percentual muito menor, mas existe) que tiveram um episodio na vida de abuso sexual de criança. Pode acontecer de alguém ter o desejo sexual por crianças, mas isso ficar só na fantasia. O crime sexual  só se concretizará quando a violência se materializa em ação".

É comum, nas prisões, os autores de violência sexual negarem a prática do crime. "Eles negam o crime, atribuem a culpa à companheira, dizem que é uma falsa denúncia. Mas, quando você se estuda, o processo judicial está tudo materializado com provas. A negativa se dá, por várias razões, preservação da vida e medo da violência, a exemplo de que quando entram no presídio, ficam em alas separadas dos demais, porque são hostilizados e podem correr risco de vida".

Por outro lado, há aqueles que assumem o desejo sexual por crianças. "É um tanto assustador quando você encontra pessoas que falam isso abertamente", diz. A psicóloga comenta que pedofilia ainda não tem cura e é motivo de preocupação para os que precisam decidir sobre a liberdade desses indivíduos. "A taxa de reincidência desse tipo de crime, mesmo quando tratados não cai drasticamente. Pesquisas não referendam a efetividade da castração química”.

A psicologia acredita em monitoramento e acompanhamento dessas pessoas quando saem da prisão e politicas públicas de assistência fora e dentro das prisões para autores de violência sexual. A intervenção psicológica busca desenvolver aspectos de empatia pelo outro (criança) e de desenvolver a capacidade cognitiva de entendimento que esse desejo violenta um ser em desenvolvimento. “É um desafio esse trabalho. Nós não temos respostas prontas e soluções imediatas para o problema da violência sexual infantil", conclui.

Denúncias

Flagrantes de estupro de menores ou relatos podem ser denunciados pela Polícia Militar via 190. O Conselho Tutelar também atende casos em que há indícios de violações de direitos de crianças e adolescentes. Os denunciantes podem ligar no disque 100, ou procurar a sede do conselho tutelar da sua região. Eles também atendem em plantão noturno a partir de denúncias recebidas diretas pelo número (65) 9 9206-6741.

 

 

Allan Pereira

 

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